Doenças comuns entre os brasileiros, como a obesidade e a hipertensão, comprometem o funcionamento do sistema renal. Acompanhar o nível de creatinina no sangue e adotar hábitos de vida saudáveis evitam que as complicações se agravem
Enfermidades complexas e que podem ser letais, as disfunções renais crônicas atingem cerca de 10 milhões de pessoas no Brasil, segundo o último levantamento da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), feito em 2011. A estimativa equivale a 50 doentes renais para cada 100 mil habitantes, número inferior ao dos Estados Unidos (110 doentes para 100 mil) e ao do Japão (205/100mil). A pesquisa sugere ainda que a doença renal seja subdiagnosticada, o que significa que milhares de pessoas portam a enfermidade e não sabem.
Segundo a SBN, são 100 mil brasileiros em diálise, com uma taxa de internação hospitalar de 4,6% ao mês (por alguma complicação) e de mortalidade de 17% ao ano - nos Estados Unidos, a mortalidade chega a 25%. O custo anual somente com terapia renal substitutiva (hemodiálise, diálise peritoneal ou transplante) chega a R$ 2 bilhões. E o crescimento do número de pacientes com doença renal crônica é de 10% ao ano.
Outro dado alarmante, segundo a pesquisa, é que, entre a população brasileira maior de 18 anos, 23% são hipertensos; 5,6%, diabéticos; 18%, fumantes; 48% têm excesso de peso e 16% são obesos. Todos esses fatores afetam a função dos rins, essenciais na limpeza do sangue e responsáveis por controlar os líquidos dentro do organismo. A doença renal crônica é o comprometimento do funcionamento de toda essa engrenagem. Quando os rins param de funcionar, o paciente apresenta acúmulo de substâncias que deveriam ser eliminadas, provocando inchaço, acúmulo de água nos pulmões (levando à falta de ar), hipertensão, além de anemia, fraqueza, perda de apetite e acúmulo de potássio, que pode resultar em parada cardíaca e problemas ósseos.
De acordo com André Nogueira, um dos coordenadores das clínicas de nefrologia da Sociedade Evangélica, mantenedora do Hospital Evangélico, em Belo Horizonte, a doença renal crônica apresenta sintomas em estágios muito avançados. Tem cinco níveis de gravidade. O primeiro indica risco de disfunção renal. O segundo, lesão renal. O terceiro, falência da função renal. O quarto, perda dos rins. E o quinto, o estágio final da doença. "É importante que se torne prática comum nos atendimentos primários de saúde (consultas clínicas de rotina) sua investigação, inclusive com pedidos de exame da creatinina, que indica se o paciente apresenta algum problema renal", diz Nogueira.
Tratamento
Depois da avaliação clínica, se o portador de doença renal chegar ao estágio mais grave, terá três opções de tratamento: diálise peritoneal, diálise ou transplante. As três modalidades de tratamento têm 100% de atendimento garantido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas, de acordo com a nefrologista Lilian do Carmo, também coordenadora das clínicas de nefrologia da Sociedade Evangélica, há uma política de incentivo ao transplante renal. A realização da cirurgia tem um custo médio de R$ 30 mil, além da manutenção mensal do paciente, que geralmente toma remédios diariamente.
"Cada comprimido custa entre R$ 30 e R$ 50 e são necessários sete por dia. Tudo isso não chega a 10% do custo de quem está no sistema de hemodiálise, que é muito mais caro. É um paciente que se interna com maior frequência, tem complicações, enfarta mais que os outros, tem risco de acidente vascular cerebral (AVC) bem maior do que a população em geral. Uma pessoa de 30 anos em diálise tem a mesma chance de morrer que outra de 80 anos que não porta a doença", compara Lilian.
A nefrologista alerta que é importante que as pessoas com diabetes, hipertensão ou histórico familiar positivo de doença renal se submetam à busca ativa sobre problemas renais. Isso serve também para quem se automedica. Há remédios comuns que levam a inflamação dos rins, como os anti-inflamatórios. Lisa Paula Esteves Pardini, nutricionista do Centro de Tratamento Nefrológico do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), ensina que, para proteger os rins, o melhor tratamento é evitar alimentos com grandes quantidades de sódio e de açúcar: "As pessoas devem adotar uma dieta que evite enlatados e embutidos em geral, como presunto, salsicha, mortadela, queijos processados, pois todos ajudam a aumentar a pressão arterial".
Consumir água adequadamente também é uma forma importante de prevenir doenças renais. Segundo a nefrologista Lilian do Carmo, para quem não sofre de problemas renais, o ideal é tomar água sempre que sentir sede: "Em torno 2l diários está de bom tamanho para se manter hidratado", diz. Esses 2l não devem ser tomados de uma só vez, mas durante todo o dia, para que o organismo possa absorver melhor o líquido. No entanto, para os portadores de alguma disfunção renal, beber muita água não é recomendável, pois causa acúmulo do líquido que o rim não consegue eliminar, fazendo com que ele fique ainda mais sobrecarregado.
Os problemas mais comuns
Nefrite
Ataca crianças e adultos depois de uma dor de garganta ou infecção de pele. Aproximadamente, de 15 a 30 dias após esses sintomas, acontecem inchaços no corpo, aumento de pressão e escurecimento da urina, consequência da hematúria (presença de sangue na urina) causada pela inflamação dos filtros renais. Quando detectada a tempo, por meio de exame de urina, a nefrite pode ser curada rapidamente.
Pielonefrite
É comum em quem tem muita infecção urinária, com maior incidência nas mulheres devido à condição anatômica de períneo. Geralmente, ataca a bexiga, podendo evoluir a ponto de tornar-se complicações renais. Para detectar essa doença, é necessária a investigação por meio de raio X ou ultrassom.
Diabetes
É causada pela grande quantidade de glicose no sangue. Após 10 anos, gera deterioração da função renal. Seu tratamento é feito à base de remédios hipoglicemiantes e insulina em doses diárias e também com dieta elaborada por um nutricionista.
Pressão alta
Em longa duração, pode causar derrame cerebral, aumento do tamanho do coração, insuficiência cardíaca e renal. A pressão alta pode ser controlada com dieta composta de alimentos com pouco sal e ingestão de remédios que a diminuam.
Litíase renal (pedras nos rins)
Pode levar à insuficiência renal crônica, principalmente se bilaterais e de repetição. O tratamento adequado e a prevenção evitam a progressão da doença renal. Quem tem pedras nos rins, além de tratar, deve investigar a causa da sua formação.
Doenças hereditárias
Alterações nos rins podem acontecer antes do nascimento e levar à insuficiência renal. Algumas doenças hereditárias podem aparecer após 20 ou 30 anos, como o rim policístico.